sábado, janeiro 03, 2015
Nicanor
Era estranho para Nicanor representar a si mesmo
através de palavras. Cada peso daqueles anos mal vividos na infancia lhe pareceriam um tijolo a menos que agora lhe faltava na casa. Tentava manter o sorriso composto, a expressão
confiante, tão em moda naqueles tempos. Mas o fato é que estava perdido em si.
Abençoado pela sempre boa vida que Deus lhe deu, os filhos, a mulher, o bom
emprego, e até o sofrimento da juventude lhe pareciam medalhas no peito. Dizia
a todos que na vida deve se entender o sofrimento, mas ele mesmo pouco havia
sofrido. Nunca lhe faltara nada, nem cerveja, nem dinheiro, nem amor, nem
solidão... Talvez mal amado pela mãe, bem certo que era, mas era ela uma em um
milhão. Todos eram entusiasmados com Nicanor. A aparencia bonachona, o alegria esfusiante e o sucesso profissional rendiam bons elogios vindo dos amigos. A vida social de Nicanor era um ilusório oásis no deserto que existia em sua alma.
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Tanto tempo que não revejo essas páginas que já nem sei como
andar por aqui.
Cada palavra bem ou mal escrita me diz pouco. Estranhos
lamentos de alguém que não conheço mais e quem nem sei se conheci. O tempo rejuvenesce
mesmo quando envelhece, mesmo quando tudo parece fraco e oco, o tempo vem e te
faz novo. Sempre há o outro dia. Os fortes não morrem e, diante do tempo, até os
fracos se tornam fortes. "Não se entra duas vezes num mesmo rio", mas o rio não muda de lugar,
quem muda são os peixes. E, ainda assim, são os mesmos peixes de sempre.
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