domingo, fevereiro 20, 2005

Aquele Tanquinho

Antes que aquelas roupas, estiradas ao tanque, criassem fungos,
Fiz questão de lavá-las com gotas de sangue,
Para que nele minhas antigas vestes
Mergulhassem fundo, e ali ficassem de molho,
Digerindo as manchas desse meu passado sujo.

Era um tanque como este que me curvo agora:
Alvejado pela cândida esperança que sempre me descoloriu
O fundo escuro e vazio que carrego em cada olho.
Por isso que digo:
Foi num tanque que minha vida evoluiu!
E nunca me importou o fardo a ser lavado,
Pois sempre tive a certeza que, mesmo que pesado,
Haveria de ser um fardo algodoado...
E se fosse seda, linho e até fio de naylon
Também lavaria com destreza, pois,
Sendo tintureiro por natureza,
Tiraria de cada trapo a essência da beleza
Dos fios com que tinham sido costurados.

Não posso dizer que, desse tanque,
- meu velho tanque de guerra -
Tirei as roupas mais belas.
As pretas se tornaram cinzas
E assim me pareceram limpas.
Mas as brancas iam ficando amarelas
O tecido ficava mais fino... e dilacerado
Se antecipava ao seu destino:
Abrigar um velho, antes menino,
Que viveu a vida pra passá-la a limpo,
E hoje, escondido em trapos,
Perdeu o medo de morrer farrapo.

domingo, fevereiro 13, 2005

SÓ AGORA VEJO...

Já não te amava desde o primeiro encontro.
E quando nos falamos aquela primeira vez - no bar -
Eu também não te amava...
Assim como não te amei no primeiro beijo,
E também não te amei na primeira transa
Naquele primeiro dia
E no dia seguinte acordei sem te amar.
Como sempre assim o foi.

Mas também não amei seu cheiro e nem seu corpo,
Não amei suas idéias
E quando te dizia aquelas palavras belas
Elas significavam tudo,
Menos amor.
Nunca te amei.
Mas um dia te quis.

Quis por pensar que o amor nascerias,
Mas também queria por saber que, sem amor,
Nada que viesse de você me prejudicaria.
Por isso que quando me pediu pra te amar,
Não amei.
Nunca te amei.
Mas um dia, e era um dia ruim,
Além de muito distante,
Te quis.

Não sei porque, mas assim o fiz:
Casei, te acolhi, e até, por uma fração,
Pensei que te amei...
Foi quando nossa semente brotou,
Mas logo vi que era por ela meu amor,
Não por você, meu bem.
Era ela o meu porque e a razão da minha teima
Em tentar te querer,
Mesmo sabendo que nunca ia te amar.

Talvez, uma gota de ternura eu tenha cultivado por ti,
Talvez eu tenha rasgado essa pele dura que me cobre,
Só pra costurá-la com o fio de naylon cortante
Que foi a nossa relação.
Sim,
Talvez, e apenas talvez, um dia te amei.
Mas e você o que fez?

Me fez ver o porque da minha falta de amor.
Mostrando todo o seu você.
O seu você que eu nunca amei
E que, agora, não quero mais!

Obrigado por tudo.

sexta-feira, fevereiro 11, 2005

PALAVRAS AO VENTO


Antes que o tom das velhas palavras retornem
Quero entornar esta gota de felicidade
E, sem me limitar a dizer a verdade,
Mentirei a mim mesmo,
Levando a alma um grito de ordem
Pra quando estiver ela quietinha,
Embriagada com minhas mentiras mesquinhas,
Eu poder furtar-lhe das dores que não são minhas
Fazendo com que nunca mais chore
Pelos que neste mundo sofrem.

Assim,
Não vou lamentar o dia decisivo,
Onde um comentário incisivo
Espantou aquele velho sorriso,
Tão presente naqueles que, em paz, agora dormem.

Antes mesmo que o verão acabe,
- talvez no fim dele eu me cale -
Espero regar as flores murchas,
Queimadas por consecutivos sois
De seguidas angustias.

E só, esquecendo este antigo lamento,
Pretendo sarar a mim e ao mundo do velho tormento,
Ser difamado por palavras tristes, perdidas ao vento,
Ao invés da biografia duma alegria fingida
Que, quem sabe um dia, poderia se fazer entre nós:
Eu e a vida.